2º CONCURSO DE LITERATURA DA FENAE – LETRAFENAE 2004

Menção honrosa na categoria Crônicas


Margot Elena Mercado de Oliveira Martim (Recife/PE)

 

Colcha de Retalhos
União Perfeita
dos Detalhes
Diferentes

Milimetricamente cortadas, cores uniformes, estilos modernos, cores sóbrias, cores fortes, desenhos cubistas, serigrafia moderna. As colchas modernas cobrem assim nossas camas. Elas retratam a uniformização na qual estamos inseridos. Existe padrão. E se você não faz parte dele, sente-se fora do que é ditado como normal.

Se não existe padrão geral, por causa das diferenças sociais, existe padrão em cada camada. Deixamos de pincelar o nosso estilo. Ele já vem estabelecido.
Sentimos falta da espontaneidade anterior à industrialização. Se de um lado ela facilitou, promoveu avanços, por outro, ela se encarregou de ditar padrões, terminando por limitar a criatividade de cada um de nós.

Como estamos sempre com pressa, o que vem pronto, “facilita” a nossa vida. Só que este tipo de comportamento ao qual dificilmente podemos fugir tem seqüestrado de nós a criatividade, a espontaneidade, o pessoal.

Cadê aquela colcha feita com carinho? Aquela de retalhos? Aquela que reunia um pedaço de historia de cada festa, comemoração?

Nos relacionamentos não tem sido diferente.
Queremos padronizar comportamento e estilo. Discutimos tanto sobre os direitos, diversos, que cada um espera ter, e, enfim, não praticamos com um mundo e sua diversidade de comportamentos e bagagem que carrega, na pessoa do outro.

Cada um é um mundo. Um mundo de experiências pessoais, nos quais temos as alegrias, o aprendizado, a educação assimilada e também os traumas. Somos um complexo de tudo isso e mais um pouco, cada qual com sua fórmula única de ser.

Certas diferenças extremas, costumam por desenvolver em nós, uma aparente atração. Se somos introvertidos e começamos a nos relacionar com uma pessoa extrovertida, a princípio isso nos encantará; porém, com o passar do tempos, opostos como esses, serão os motivos causadores de discórdia e separação.

“Não deixa ninguém falar...”. “Tá contando a piada pela enésima vez” .”Quer ser o centro das atenções”.”Quer aparecer”.”Não agüento mais, meu jeito é mais pacato, não combina com ...”.

Mas... temos um infindável número de diferenças, suportáveis, convivíveis e até memoráveis. As suportáveis são aquelas que não admiramos, diferem no nosso modo de pensar, mas, não agridem valores da nossa personalidade. As convivíveis capacitam em nós, a arte do conviver, administrar diferenças, elaborar esquemas para a manutenção do bom clima familiar . As memoráveis & comemoráveis nos engrandecem, elas nos enriquecem, elas fomentam em nós o que temos de melhor, são como adubo para nosso desenvolvimento em qualquer área.

Falta de visão, é a causa, normalmente, de misturarmos todas essas diferenças, empacotando-as, num só volume. Misturamos o que não toleramos, com o que toleramos, suportamos e até admiramos.

E, é nesse comportamento que perdemos oportunidades de crescimento à dois.

Ninguém está aqui dizendo que é fácil. Aliás é bem difícil. Exige de nós um constante investimento. Exige de nós uma pré-disposição, trabalhosa, de querer fazer limonada com limões. Mas... quem disse que uma limonada bem feita, sem o amargor, não gera satisfação? Hein?
Nada de tapar o sol com a peneira. Se temos, em procrastinar, a estratégia para os desacertos, avisados estamos que, mais cedo do que tarde, esses desacertos poderão provocar desentendimentos maiores. Se alguma conduta, mania, enfim... nos é insuportável ou desconfortável, negociemos. Não há nada, nesse sentido, que seja, ou melhor, que deva ser imune a diálogos de negociação.

Firmes quando a ocasião assim o exigir, flexíveis quando houver necessidade de entendimento, disponíveis quando entendamos houver possibilidades positivas no ato de ceder, e agradecidos quando nessas diferenças tenhamos agregado mais uma nova maneira de enxergar a beleza do viver a dois.

Diferente das colchas de hoje em dia, na sua maioria, produzidas em escala, nós não somos nada uniformes. Viva a diversidade que cada um de nós carrega. Cada um de nós complexo, sem cópia ou clone, que ao se relacionar dá um pouco de si para os outros, e recebe de cada um também.

Ninguém enxergará a vida como eu ou você. Ninguém viverá a vida como a minha ou a sua. Tudo será vivido uma única vez e só ao seu ver. Aproveitemos da convivência com o outro, tudo do que dessa convivência puder ser aproveitado.

Na diversidade que carreguemos ao encontrarmos outra pessoa disposta a compartilhar o seu ser diverso, juntos possamos construir uma vida, a dois, nossa, única, fruto de cores e tecidos de texturas diferentes, onde cada textura e cor representa uma data, um evento , uma história, construindo, dando forma, costurando assim uma colcha de retalhos, a nossa colcha de retalhos.